AS ÁGUAS DA ESPERANÇA E DA POESIA
O homem recolhe calmamente seus pertences, guarda na bolsa verde o lápis, o bloco de anotações e volta-se pela última vez para o mar. Este lhe responde enviando mais uma onda, desta vez mais forte, que apaga da areia os traços feitos com o lápis. O homem levanta-se e agradece as águas por serem suas cúmplices pessoais e ficcionais, já que elas representam para ele a alegoria de criação do universo, da renovação e do equilíbrio cósmico que possibilitou-lhe e a suas personagens enxergarem-se e compreenderem-se para, então, verem e entenderem profundamente todas as “verdades” que se lhe apresentavam.
Ele sabe que as águas são guardiãs da sabedoria angolana já que elas constituem o rio que divide o mundo dos vivos e dos espíritos, de cuja união depende a harmonia da existência porque um inexiste sem o outro. É através do seu correr incessante que se movem as forças primordiais geradoras da vida que fazem com que exista sempre uma possibilidade de recomeço. Tal como nas histórias ouvidas em criança, a evocação dos mitos de origem da vida encerra uma possibilidade de o povo angolano restaurar a harmonia cósmica após os anos de guerra. Por esta razão as águas dos rios, lagoas e mares são para ele um manancial de esperanças. A água lilás, cuja cor e aroma curam e alegram quem a toque ou aspire foi a alegria do povo da Montanha da Poesia, mas também a causa da guerra que o destruiu, segundo fábula que ele começou a rascunhar muitos anos antes. No entanto, é da força primordial delas que sai o canto de Kianda, o ser mítico das águas que, em outra de suas narrativas, ergueu seu canto majestoso e triunfal e alterou com seu poder ancestral tudo aquilo que o homem não pôde ou não quis mudar.
Pensando nisso, Pepetela, o homem, o escritor, larga na areia a velha bolsa verde e entra no mar para o último mergulho do dia, para sentir-se revigorado e também para ouvir lá embaixo das ondas ecos do canto guerreiro e divinal das Kiandas, que com suas fitas multicoloridas o saúdam e encorajam a ser agente de conscientização e transformação pela magia e poesia das palavras que ele engenhosamente QUANDO .....
TUDO ACONTECEU...
1941: Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos (Pepetela) nasce em Benguela, Angola, em 29 de outubro. - 1958: Parte para Lisboa, onde ingressa no Instituto Superior Técnico (Engenharia) que freqüenta até 1960. - 1961: Transfere-se para o curso de Letras. Neste mesmo ano acontece, em Luanda, a revolta que origina a Guerra Colonial. - 1963: Torna-se militante do MPLA - Movimento Popular para a Libertação de Angola. - 1960/1970: Freqüenta a Casa dos Estudantes do Império, em Lisboa, berço dos ideais de independência. Exilado na França e na Argélia, posteriormente gradua-se em Sociologia. - 1975: Independência de Angola. Nomeado Vice-Ministro da Educação no governo de Agostinho Neto. - 1997: Ganha o Prémio Camões pelo conjunto da sua obra. - 2002: Recebe a Ordem do Rio Branco, Brasil. - Actualmente é professor de Sociologia da Faculdade de Arquitetura de Luanda, onde vive.
Comentários
Vim agradecer sua preciosa presença em meu jardim.
Linda partilha esta postagem enriquecedora.
Tenha um ótimo dia.
Com carinho, Lady.
É sempre com prazer que visito o seu espaço e dar a minha modesta opinião.
Sòmente livres do peso do passado poderemos aproveitar o valioso resultado de uma RENOVAÇÃO.
Pepetela[Prémio Camões 1997] é um dos maiores escritores angolanos que admiro,
Um abraço,
Jorge
Abraços e ótimo domingo pra ti.
Furtado.
Sobre a tua postagem e este grande homem, fiz um artigo quando do inicio das minhas lides pelos blogues e que na altura por não ser lido, nem sequer teve um comentário. Como admirador incondicional de Pepetela como pessoa, escritor, politico e do seu percurso, deixo se quiseres "espreitar", o link da referida postagem.
Gosto imenso nas tuas visitas que agradeço e para mim foi uma surpresa agradável ler este teu artigo.
Kandandos
Só poderiamos mesmo sentir-nos orgulhosos por Pepetela, o grande escritor Angolano, ter nascido em Benguela.
Um grande abraço sempre com saudades de tudo e de todos.
Benguela... sempre!!!
com carinho
Hana